Um dia desses estava pensando: a democracia brasileira é uma dama tida como vagabunda, que todo mundo tira para dançar e passa a mão. Mas ninguém a leva para casa. Fica bêbada e só, no meio do salão.
Oposição e situação se apropriam do discurso da democracia e cada ala justifica seus atos por meio dela, mas o que se vê na prática é o uso indevido não só da palavra e sim desse sistema de governo que se desgasta em discursos vazios, desprovidos de ações contundentes que a sustentem.
Um governo do povo para o povo é uma visão romântica do que é a democracia. A igualdade entre os cidadãos que estão sujeitos a ela, em boa parte das vezes, é mero elemento de retórica.
No mundo real da política e de seus conchavos tudo é acerto nos gabinetes. O dito interesse comum, o do povo, é regido por grupos que conduzem este povo ao seu bel prazer.
É ingênuo acreditar que a crise política brasileira terminará com o impeachment da presidente. É ingênuo acreditar que todo o processo que conduziu a ele não está contaminado. É ingênuo acreditar que com a sua permanência – fortalecida por uma vitória contra esse processo no Senado Federal – a presidente teria condição de governar.
Tudo é incerto.
Incerto porque os interesses são vários. Sejam eles no campo político, econômico e até mesmo midiático. Interesses que excluem o cidadão comum e o submetem aos efeitos da crise política e econômica que está aí. Tudo isso não é democrático.
Democrático seria se as instituições não fossem incertas. Mais do que isso, que não fossem regidas por pessoas com a honra maculada por atos que em países mais sérios já as levariam à cadeia.
Por aqui as coisas só vão mudar quando parlamento não for palco, o judiciário deixar de ser um soberbo de toga e o executivo um balcão de negócios. As coisas começarão a mudar quando a democracia for mais sentida do que discursada.
Para que tudo isso se efetive leva tempo e talvez, nem de longe, sentiremos os efeitos desejados agora. A democracia brasileira, comparada a outras, engatinha e ainda demorará um punhado de tempo para amadurecer.
A dama, por algum tempo, ainda será tratada como uma reles vagabunda. Mesmo assim há de se considerar, nesse contexto, que até as vagabundas merecem respeito e também são dignas de um tratamento cortês.
Sendo assim, tanto no caso da dama e/ou no da vagabunda, o problema está em quem as conduz. São esses que as violentam e impingem sobre elas os seus valores.
A democracia é o que é. Ela funcionaria se não fosse mal-interpretada. Violentada até. Neste caos em que vivemos é a democracia e o povo simples os que mais sofrem. São punidos diariamente.