Rodrigo Dias

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Quando eu era pequeno, lembro bem de uma simpatia que a minha mãe mantinha bem guardada atrás de uma mala lá em cima do guarda-roupa. Eram galhos com poucas folhas, secos, e que foram benzidos num domingo de ramos, quando o povo seguia em procissão acompanhando o senhor Jesus. Todos seguravam seus ramos e saudavam o Salvador.

Na minha cabeça de criança, entendia que aqueles raminhos eram mesmo poderosos e não deviam ser brinquedo, pois ficavam num esconderijo. Longe do meu alcance e da minha traquinagem.

Era em dias de chuvas intensas, aqueles com muito trovão e relâmpagos – eu e meus irmãos ficávamos escondidinhos embaixo das asas dos meus pais – que minha mãe demonstrava sua fé. Naquela época, chuvas assim representavam prejuízos, e para uma casa bem humilde e de telhas frágeis o risco era ainda maior.

Como boa rezadeira que é, minha mãe pegava seus galhinhos bentos e queimava-os rezando para São Jerônimo e Santa Barbara. Aprendera desde cedo que era assim que se procedia. Os ramos bentos num domingo de ramos, além de saudar o Senhor, serviam para acalmar tempestades.

E não é que na maioria das vezes a reza funcionava, e aos poucos os relâmpagos e trovões se afastavam da nossa casa, pondo todos em segurança? Fé é assim mesmo, não se explica. Apenas se exercita e se houver merecimentos as dádivas chegam.

Com toda a modernidade do mundo de hoje é curioso ver que tradições como essas ainda são mantidas. E não se trata só de crendice pueril. Essas manifestações são puras e levam o homem a entender que a fé é combustível fundamental, e que na bonança ou não é sempre tempo de colocá-la em prática.

Os moradores da bucólica e bem preservada cidade de Itapecerica, interior de Minas Gerais, deram uma prova de que há mesmo de se contar com a indulgência Divina para dar um alento ao homem que vem maltratando o que o Criador nos deu como sua herança.

Foi comovente ver aquele povo em procissão, orando, com uma imagem do Senhor dos Passos, que há 77 anos não saía da igreja de São Francisco nessas circunstâncias. O povo de lá, castigado por uma severa falta de água, orou pela chuva e, coincidência ou não, ela veio.

A reza não exime nossas responsabilidades com o planeta ou com o próximo. Cada um tem seu dever e é necessário ser um seguidor do que edifica e faz prosperar. No entanto, a reza é um elemento agregador e quando se recorre a ela, nesses termos, percebe-se o quão somos frágeis.

Ignorância? Não. Para mim é fé e nesse caso é preciso ter para entender.

A terra não é perene. Nós não somos perenes. O que faz dar longevidade é a consciência e o respeito. Entender que o mundo e nós somos um mesmo todo e que cada cutucada que damos na terra a sentimos, mais cedo ou mais tarde.

A falta de água e o ebola estão num mesmo pacote. Cabe ao homem gerenciar essas e outras questões. Se não houver mobilização na resolução dos problemas que afligem a humanidade não há reza que dê jeito.

Nem mesmo os ramos bentos da minha mãe, que há anos não vejo, dão jeito nessas tempestades. Difícil dormir com esse barulho, o que dirá sobreviver, então?