Empresa iria ficar a frente da gestão por dois meses sem custo para o município até realização de licitação; MPF entendeu que há irregularidades no contrato
O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF) obteve liminar em ação civil pública suspendendo todos os efeitos de um contrato firmado entre o Município de Divinópolis e a empresa LG Serviços Aeroportuários Ltda para exploração do Aeroporto Brigadeiro Cabral (SNDV). De acordo com a decisão, a empresa está proibida de operar no aeroporto e o Município deve impedir qualquer atividade dela no local.
Segundo ação do MPF, a prefeitura de Divinópolis entregou a exploração do Aeroporto Brigadeiro Cabral para a LG Serviços Aeroportuários. A empresa foi selecionada sem o devido processo licitatório, em clara violação aos mais básicos princípios constitucionais.
A operação do Aeroporto Brigadeiro Cabral era realizada pela Socicam Administração, Projeto e Representações Ltda, mas a empresa rescindiu o contrato no início do ano. Assim, o aeroporto da cidade vinha sendo administrado pelo próprio município. Em 25 de outubro, a prefeitura celebrou um contrato de doação de serviços com a empresa LG Serviços Aeroportuários Ltda, utilizando-se ainda da lei municipal nº 8.448/2018, que institui o Programa Adote um Bem Público.
Para o procurador da República Gustavo de Carvalho de Fonseca, autor da ação, o contrato de doação e a adoção de um bem público foram expedientes usados de modo indevido, apenas para contornar a exigência de licitação. Na realidade, não há doação de serviços, mas a própria outorga da exploração do aeroporto à empresa. E a lei municipal nº 8.448/2018 só é válida para bens de uso comum do povo, como praças, parques, jardins e bicicletários.
De acordo com a ação, aplicar a referida lei poderia “representar a entrega de um equipamento altamente complexo e cercado de rigorosa regulamentação ao primeiro aventureiro que se candidatasse”.
Na liminar, o juízo da 1ª Vara Federal Cível de Divinópolis ressalta que a lei municipal não pode ser aplicada no caso. “Cumpre registrar que, mesmo que o “aeroporto” fosse considerado bem de uso comum do povo (que não é), a Lei municipal nº 8.448/2018, de qualquer sorte, não poderia ser aplicada na espécie.”
A empresa
Quando foi cogitada para assumir a operação do aeroporto, a LG Serviços Aeroportuários Ltda sequer existia. Em 17 de abril, um site de notícias local publicou uma matéria que informava que “a intenção (do Município) é firmar parceria com a empresa LG Serviços Aeroportuários”. Porém, a empresa só foi registrada no dia 10 de maio. A companhia foi fundada há apenas seis meses e é sediada em um endereço residencial, sem empregados registrados e com o capital social de apenas R$ 30 mil.
Para o MPF, isso demonstra que a decisão foi tomada a portas fechadas e sem licitação. Depois disso, o escolhido, com a segurança de quem efetivamente seria contemplado, como de fato veio a acontecer, cuidou de formalizar uma pessoa jurídica para tal.
A liminar reconheceu ainda que o instrumento utilizado pelo município permite a exploração de publicidade no aeroporto por parte da empresa e que isso também viola a lei.
“Tal instituto (doação) restou desconfigurado no momento em que o ente público oferece contrapartida ao projeto desenvolvido, este consubstanciado em “espaço para publicidade na área do bem público adotado” (art. 15). Neste contexto, a “doação”, tendo contrapartida, demandaria licitação, sob pena de contrariar os princípios da impessoalidade e moralidade”, escreveu na decisão o magistrado.
Articulações
Empresários de Divinópolis se uniram para viabilizar o retorno das operações do aeroporto após a Socicam deixar a gestão por falta de pagamento. O abandono resultou na suspensão dos voos da Azul (Divinópolis/Campinas). Pensando no desenvolvimento econômico, eles se mobilizaram e viabilizaram a doação.
Com a retomada das atividades pela LG a Azul declarou ter interesse de voltar com a linha.
Em nota, a prefeitura informou que o município “ainda não tem conhecimento formal do teor da decisão proferida pela Justiça Federal a propósito do contrato de doação celebrado com a sociedade-empresária LG Serviços Aeroportuários Ltda., que, conforme já foi amplamente divulgado, se prontificou a gerenciar o Aeroporto Brigadeiro Antônio Cabral, até o dia 31 de dezembro próximo, sem nenhum custo para os cofres municipais, de modo a evitar o possível fechamento do aeródromo, sinalizado por auto de infração lavrado pela ANAC com base em inspeção realizada nos dias 25 e 26 de setembro último”.
“Uma vez cientificado do teor da referida decisão judicial, o Município de Divinópolis buscará o melhor caminho a seguir, pela óptica do atendimento do interesse público, com o único e exclusivo propósito de beneficiar a população de Divinópolis e de toda a região centro-oeste, ainda mais quando se considera a brutal crise financeira pela qual passa na atualidade, ao lado dos demais oitocentos e cinquenta e dois Municípios mineiros”.