Não a julguei. O choro me parecia falso, o motivo irrisório e o escândalo desnecessário, mas a consolei. E sobre a dura realidade, o desgaste diário, a falta de dinheiro e, às vezes, de emprego, eu não a culpei. Também não descontei minhas frustrações diárias nos meus filhos em busca de atenção. Não deixei de cantar a canção preferida de Isabela, de brincar com Alberto ou aguar as violetas de mamãe. Não perdi a paciência ouvindo as intermináveis histórias de meu velho e não desliguei a TV, já irritado, enquanto ele insistia, em meio a roncos, que estava vendo Faustão.
E quando terminava o dia, sob a luz fraca da cozinha, eu mastigava arroz duro e agradecia. De olhos semicerrados, em uma reflexão diária, eu podia ver Isabela e Alberto brincando na sala; eu agradecia novamente.
Nas intermináveis noites de insônia, eu planejava como ser uma pessoa melhor: diminuí a bebida, aumentei as declarações, sorri mais, cobrei menos e fiz mais. Não houve sequer um dia de noite ruim, de consciência pesada ou rancor.
E do alto da mangueira, o sol triunfava sobre mais um dia. Eu podia ver minha linda Suzane na cozinha e as crianças brincando no saguão; o olho roxo de minha linda ainda sangrava, o olhar assustado de Alberto com o carrinho na mão nitidamente me buscava no portão. Medo. Não respeito, medo.
E com o pinicar da corda no pescoço, eu refletia o que eu podia ter sido, o que se esperava de mim, o que eu quis, sem fazer força para ter; um café com um sorriso, dois beijos de dois pequenos, um olhar de paixão de Isabela e um abraço esmagante dos meninos – não me solte, não me deixe ir.
E se a ausência provoca alívio e não saudade e a presença dor e não alívio – sem cartas e sem recados – ficam as desculpas e arrependimentos, nunca ditos e inaceitáveis