Antonio Andrade

 

coluna toninhoCadernos e bolsa numa mão, bolsa na outra, mochila nas costas e um andar desengonçado. Mauro mal conseguia andar com tantas coisas, enquanto Ana caminhava dois passos à frente, rindo com duas amigas.

 

Mesmo ano, mesma classe, uma rotina: Mauro passava em sua casa todas as manhãs, levava seu material e deixava na mesa dela, ao lado da sua. Se buscava água, trazia dois copos, se fosse comer, era algo que ela comesse para acompanhá-la. Ana o abraçava, o beijava e fazia juras de amizade. Mauro achava que a amava. Ana precisava dele.

 

E a menina vivia em um altar, inatingível, sob uma aureola e um manto. Se ela ria, ele ria, se ela queria ele queria, se ela ficasse triste, ele a animava, se ela pedisse, bem, ela não pedia, ele se antecipava. Ana tinha os deveres de escola feitos, a comida no recreio à sua escolha e um grande ouvinte, que de cabelo com pontas duplas a briga com amigas, sempre respondia com a mesma indignação:

 

– Não fique assim, estou aqui. – falava enquanto a abraçava e cheirava seus cabelos.

 

E ela conheceu Jair: jaqueta Hard Rock, All Star cano alto e um topete de puro gel. Pronto. Mauro a incentivou no namoro, porque ela queria, deu o ombro para ela chorar quando foi traída e riu, quase quebrando a mandíbula, quando ela disse que ia casar.

 

– Você é o padrinho.

 

Engasgou.

 

Desviou o olhar, retomou a respiração, riu, ficou sério, a abraçou.

 

– Estou muito feliz por você.

 

Jair tinha outras, Mauro sabia, também sabia que Ana não foi feita para ser contrariada, não por ele, que se imaginava numa conquista invisível – então ele se calou, se rendeu ao que ela escolheu como felicidade, a apoiou no erro e foi testemunha, na primeira fileira, mantendo seu sorriso engessado.

 

Ana amava Mauro. Jair amava as mulheres. Mauro amava servir.