Enquanto eu me espremia entre caixas molhadas e becos de padrões residenciais de iluminação, a chuva caia torrencialmente formando poças aos meus pés.
Ainda no meio da tarde, meus olhos semiabertos ardiam com o sol ensaiando timidamente sua graça. Eu mirava as nuvens torcendo.
– Sai, sai, sai – a velha gritava, enquanto varria as folhas secas que caíram da Canjarana.
30 graus de repente.
Me sacudia com toda força que podia e seguia meu rumo sem rumo, ora para a esquerda, ora para a direita, dependia de onde vinha o cheiro de comida. Corria entre carros, mirava motos, recuava quando paravam e você surgia. Eu queria correr ao seu encontro, mas esperava, olhava de longe, analisava, você gesticulava me chamando e eu freando a vontade caminhava lentamente, desconfiado, até que sua mão alcançava minha cabeça me desmoronando num porto seguro que eu só reconhecia no seu cheiro amendoado.
Meus olhos fechavam totalmente pela primeira vez em dias, meu coração disparava, minha alma sorria e você me apertava forte, firme, entre palavras incompreensíveis, mas com um sorriso tão largo que me fazia, inconscientemente, pular em seus braços – e você me segurava.
A chuva começava a atacar novamente e eu corria para meu esconderijo, enquanto você se protegia na pequena marquise até que eu virasse a esquina.
Já durava algum tempo aquilo, eu não sabia para onde ir, não sabia se podia voltar, mas esperava, aguardava, porque você era a melhor parte do meu dia. E quando você não aparecia, nada fazia sentido e eu me encolhia no meu vazio aguardando a nova chance do próximo dia.
E então um dia tudo mudou. Do jeito que corri ao te ver eu pulei com toda força e você nunca mais me soltou. Você me levou para o seu mundo e se aconchegou ao meu. Acabou a espera, a saudade dos carinhos e a dúvida de sua chegada. Você estava ali todos os dias, me garantindo mais do que eu sonhar e eu, sem conseguir retribuir, deitava em seus pés e dormia.