Foto: Divulgação

Rodrigo Dias

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Aqueles que são mais ou menos da minha geração, e das anteriores também, ouviram com certa frequência a seguinte sentença: mil chegará, mas dois mil não passará.

O ditado era um clássico e na chegada do ano 2000 aterrorizou muita gente, principalmente os mais religiosos, já que ele, em tese, faria parte de algumas profecias. Estamos aí e nada de mais catastrófico aconteceu que antecipasse o nosso fim.

Os anos 2000 debutam logo mais com a chegada de 2015. Se o mundo não acabou como a velha e caduca previsão, muita coisa mudou. Assistindo a um programa de TV ouço um termo interessante: vivemos o período da singularização, explicava um jornalista do GloboNews em Pauta.

E de fato é isso mesmo. Nunca o indivíduo foi tão indivíduo. Estamos, cada vez mais, voltados para o que é singular. O que é próprio. Imagine, por exemplo, se lá no século XX Henry Ford poderia conceber que qualquer pessoa, de casa via internet, pudesse personalizar seu próprio carro. Com as cores e acessórios que melhor lhe conviessem. Ford quebraria na primeira semana com o seu clássico Ford T que só era produzido, em larga escala, na cor preta e de um único jeito.

As invenções e comodidade da vida moderna correm na direção daquilo que favorece o que é individual. Tudo bem ao alcance das mãos, mas tudo com o seu preço pela exclusividade.

Se comparado há 30 ou 50 anos, qualquer um de nós, pelas facilidades do mundo virtual, temos mais acesso a informações estratégicas do que muitos governos, mas essa mesma facilidade revela o privado.

A vida alheia e a nossa nunca foram tão bisbilhotadas e escarafunchadas. A teoria do grande irmão deixou a literatura e instalou-se nas nossas vidas. Somos todos monitorados em menor ou maior escala. Vai depender do interesse de quem o faz.

Interesse, talvez essa seja uma das palavras da moda que norteiam boa parte das nossas relações. O mundo pós-moderno obriga o homem a recorrer a técnicas quase medievais, adaptadas à realidade atual, para sobreviver. Relações capengas, conduzidas pelos interesses, brotam às pencas. E por vezes as máscaras são artifícios necessários para “existir”.

Mas tudo cansa. Por isso o indivíduo recorre, cada vez mais, à busca do eu perdido. Nos dias atuais ter um terapeuta é tão essencial como ter um dentista de confiança. Por vezes queremos o isolamento, mas não queremos ficar sozinhos. É necessário alguém para dividir o fardo. Mas se quer, também, a conveniência de ligar e desligar essa ligação de acordo com a nossa vontade. Neste aspecto, para muitos as redes sociais cumprem esse papel.

O que tudo isso tem a ver com a virada do ano? Bom, quase nada. A não ser o fato de que a vida é contínua e a divisão do tempo é coisa nossa. Um ciclo não se interrompe, necessariamente, com a mudança de um dígito.

Depende, muito, da maturação de cada um. Os problemas e as glórias podem se arrastar para o próximo ano e os outros se não houver mudança íntima. E essa mudança não obedece, necessariamente, a convenção estipulada do tempo. 

 

artigorodrigodias@gmail.com