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Social, climático: “apesar de”, não podemos deixar que nossas vitórias nos ceguem para os problemas sociais coletivos

“Como posso ser triste em 2024, se…”. A trend que tomou conta de perfis nas redes sociais é mais um desvio para nos submergir em meio às revoltas coletivas que o ano também carrega. Se contabilizar conquistas individuais cria a sensação de um ano triunfal, no campo social, nada surpreendeu.

Cada “evento” teve repercussão distinta, seja pela dimensão ou pelos prejuízos de toda ordem. Embora a tragédia no Rio Grande do Sul tenha despertado, em abril, a solidariedade, ela deixou um rastro de mortes e destruição que evidenciou os impactos da crise climática.

A proporção do desastre comoveu canto a canto do país, mas não foi suficiente para reacender a discussão sobre os impactos da crise climática. Se as chuvas evidenciaram os riscos aos quais estamos sujeitos, perto da gente, tudo ainda parece distante, embora iminente.

Basta as chuvas começarem para ficar claro o despreparo dos governos para lidar com eventos que se repetem ano a ano com intensidades distintas. São “eventos” sazonais. Vidas se perdem, enquanto nós nos perdemos nas tendências que tornam mais superficial a realidade.

O que impede ações preventivas e soluções eficazes? Passa ano, entra ano, e a pergunta fica sem respostas.

Se no noticiário a repetição dos fatos tenta alertar e chamar a atenção das autoridades para a busca de soluções reais, nas redes sociais os “políticos influencers” transformam desastres em circo digital, ganhando seguidores à custa de desinformação.

Alienar é mais simples do que propor e executar projetos. Já quando o “circo pega fogo” ou a “cidade fica debaixo d’água”, eles somem num piscar de olhos.

Na sua cidade ou na vizinha, quantos pontos se alagaram com as chuvas? Em quais se formaram cortinas de fumaça aguçadas pelas queimadas?

As queimadas pelo Brasil, por sinal, ameaçam a biodiversidade e tornam crítica a qualidade do ar. Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas, é a campeã no estado. A ocupação no pódio não orgulha, apenas preocupa.

De assédio sexual à morte do cão Joca

Mas não é apenas isso. Em 2024, vimos a denúncia de assédio sexual derrubar o ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida. E uma declaração machista levou o CEO da G4 Educação, Tallis Gomes, a renunciar.

Houve a comoção pela morte do cachorro Joca, transportado pela Gol, e casos de suicídio provocados por bullying, como o do menino de 14 anos que se matou a caminho do Colégio Bandeirantes, em São Paulo. Negro, homossexual e de origem humilde, ele era alvo de colegas com agressões verbais e físicas.

Nunca se falou tanto em liberdade de expressão, na mesma proporção em que os conceitos foram totalmente desviados para justificar a propagação de fake news e ataques à honra. O bloqueio da rede social X desencadeou uma série de debates, mas deixou uma mensagem clara: regras existem para serem seguidas.

Aqui, não vou elencar as tragédias pontuais, como quedas de avião, acidentes envolvendo ônibus, ou brigas de torcidas. Fatos que levaram várias pessoas à morte. “Eventos” que deixam marcas e dor, mas que reforçam que podemos nos sentir tristes “apesar de”.

As conquistas pessoais são combustíveis para seguirmos “apesar de”. Contudo, “apesar de”, não podemos deixar que nossas vitórias nos ceguem para os problemas sociais coletivos que nos rodeiam.

*Amanda Quintiliano é fundadora e editora do Portal Gerais.
*Artigo de opinião