Considerado o maior concurso da história de Divinópolis, certame não prevê reserva de cotas raciais; “Reparação ao povo preto”, afirma presidente do Mundi
A ausência de cotas raciais no concurso público da prefeitura de Divinópolis é questionada pelo Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial (Compir). A partir de decisão tomada na terça-feira (13/8), em reunião extraordinária, o conselho vai protocolar junto ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) um documento solicitando parecer sobre a falta de reserva de cotas raciais.
A reportagem do PORTAL GERAIS entrou em contato com a assessoria da prefeitura de Divinópolis nesta quarta-feira (14/8). Porém, não obteve retorno até a publicação desta matéria, nesta quinta-feira (15/8).
Maior Concurso da História de Divinópolis
Classificado como o “maior da história de Divinópolis”, o certame prevê 1.426 vagas distribuídas em 111 cargos. As inscrições começaram no dia 5 de agosto. Um dia depois, o pré-candidato a vereador e membro do Conselho Municipal de Educação, Vitor Costa (PT) provocou o Compir. Ele, questionou sobre a ausência de cotas raciais do concurso da prefeitura de Divinópolis.
A partir da provocação e discussão entre os membros, ficou decidida a elaboração do documento pelas advogadas representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/Divinópolis).
Desentendimentos sobre Cotas Raciais no Concurso da Prefeitura de Divinópolis
De acordo com a Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB/Divinópolis, o município argumentou que não havia lei local tratando sobre a temática de reserva de vagas. Conforme a OAB, ele argumentou que a Lei 12.990/2014 tem apenas abrangência federal, não vinculando entes estaduais e municipais.
“No entanto, há a Carta da Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (Cirdi), publicada através do Decreto 10.932, de 10 de janeiro de 2022. Com sua promulgação, o dispositivo ganhou status de emenda constitucional e criou, em seu artigo 5º, uma obrigação vinculante aos poderes públicos em relação à adoção de políticas especiais e ações afirmativas de igualdade racial”, explicou a Comissão por meio de nota.
A Comissão afirmou ainda que, de acordo com o artigo 5º, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988, acordos e tratados internacionais aprovados nas duas casas do Congresso Nacional, em dois turnos e com mais de três quintos dos votos, passam a integrar o bloco de princípios e regras constitucionais do país, recebendo o mesmo status jurídico de emenda constitucional.
“Assim, a reserva de vagas para pessoas negras em concursos públicos se tornou uma obrigação vinculante de todos os entes federativos. Não há como se falar que inexiste lei vinculando entes municipais e estaduais a realizar políticas afirmativas de cunho racial em seus certames, quando, na verdade, a matéria agora tem imperativo e normatividade constitucional”, completa a nota.
Conselho apartidário
Presidente do Compir, Ronaldo Maurício do Carmo ressaltou que até o momento não enviou o documento ao MP, tendo em vista que aguarda o parecer o Conselho Estadual “para que as conselheiras que ocupam a cadeira da OAB façam a redação e todas as entidades assinem o documento”. Afirmou ainda que o “conselho é apartidário”.
“Não podemos correr o risco de sermos usados como trampolim político para qualquer candidato”.
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Reparação e Justiça Social
O presidente do Movimento Unificado Negro de Divinópolis (Mundi) e conselheiro do Compir, Adjanir Silva, declarou que o documento que deverá ser enviado ao MPMG busca esclarecimentos sobre os divergentes entendimentos legais. Para ele, as cotas são uma forma de “reparação ao povo preto”.
“Não é facilitar, mas assegurar que se tenha acesso a tudo que até hoje é negado ao povo preto”, argumenta Adjanir Silva.
Paralelamente, o movimento e o conselho buscarão a regulamentação.
“Precisamos elaborar um projeto de lei regulamentando no município para evitar esse tipo de desentendimento no futuro.”
Decisão Judicial em Carlos Chagas como Precedente
O MPMG, por meio da Promotoria de Justiça de Carlos Chagas e da Coordenadoria de Combate ao Racismo e Todas as Outras Formas de Discriminação (Ccrad), obteve na Justiça, em maio deste ano, uma decisão liminar que obrigou o município do Vale do Mucuri a prever cota racial no edital do concurso público.
Conforme a Ação Civil Pública (ACP), a prefeitura de Carlos Chagas publicou o edital do certame 01/2023 sem prever reserva de vagas para pessoas negras.
De acordo com o promotor de Justiça em cooperação em Carlos Chagas, Ederson Morales Novakoski, e o coordenador da Ccrad, Allender Barreto, com a ratificação da Cirdi, reivindicar a reserva de vagas para pessoas negras em concursos públicos se tornou uma obrigação vinculante de todos os entes federativos.
Dessa forma, com base no comando constitucional e convencional, fundamentado no Estatuto da Igualdade Racial, a Justiça deferiu o pedido liminar do Ministério Público. Assim, determinou ao município a readequação do edital com a devida previsão de cota racial no concurso. Para isso, seguindo os parâmetros da Lei Federal n.º 12.990 de 2014, além de outras medidas decorrentes do ajuste.
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Compir Provocado a Tomar Posição
A provocação ao Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Divinópolis partiu de um membro do Conselho Municipal de Educação. Vitor Costa tratou a ausência das cotas raciais como uma “omissão inaceitável que vai contra os princípios de reparação histórica e justiça social”. Ele argumentou que essa prática deve orientar as políticas públicas.
“Quando se trata de reparação histórica, é dever de toda a sociedade, e principalmente dos órgãos públicos, atuar em prol da justiça social.”, declarou.
Ele sugeriu que o Compir se posicionasse formalmente, exigindo respostas concretas da prefeitura. Além disso, sugeriu o encaminhamento de denúncia ao Ministério Público e pressionou a vice-prefeita Janete Aparecida (Avante) e os vereadores que se autodeclaram negros para garantir a aprovação de um projeto de lei sobre a reserva de cotas em processos seletivos e concursos no município de Divinópolis.
Texto atualizado às 14h49 com a posição do presidente do Compir.