Letícia Ferreira
Com Funedi/Uemg
Dificuldade em se concentrar nos estudos ou até mesmo de prestar atenção na fala do outro pode ser um dos sintomas do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, o TDAH, que já dá sinais ainda na infância. A psicóloga Marilene Cortez, cuja tese de doutorado discute o tema, explica que o TDAH envolve alterações cognitivas que refletem no comportamento. A professora do curso de Psicologia da Funedi/Uemg explica que “estas alterações promovem dificuldades no cotidiano”. Por exemplo, a pessoa com o TDAH pode apresentar dificuldade no planejamento e na execução de alguma tarefa.
Estas são situações comuns que a família do estudante de 14 anos Lincoln Ferreira conhece muito bem. O garoto começou a apresentar os sintomas do TDAH aos seis anos, quando iniciou a fase escolar. Nanci Aparecida Barbosa, madrasta do adolescente, conta que era possível perceber que ele não tinha concentração ao realizar as tarefas escolares em casa. “Explicávamos uma atividade para ele e, já no outro dia, quando o dever de casa era semelhante, novamente ele tinha dificuldade em fazer sozinho a mesma tarefa”, ressalta a madrasta do estudante.No caso de Lincoln, os sintomas começaram a ser notados aos seis anos.
A psicóloga alerta: “O TDAH é um transtorno que sofre grande influência genética. Por exemplo, ele pode se manifestar em diversos membros de uma mesma família”. Por esta razão, não é incomum que um dos pais apresente o transtorno também. Nanci também observava que, quando criança, Lincoln tinha certa dificuldade em se expressar, incomum para a idade dele. “As frases dele geralmente eram incompletas, ou ele repetia a mesma informação”, conclui. Como lembra a pesquisadora, a linguagem é um dos processos cognitivos que podem estar alterados no TDAH.
Diagnóstico
“O TDAH não é um transtorno de fácil diagnóstico, pois não basta apenas observar as alterações comportamentais; em uma boa avaliação para confirmar a suspeita, é de extrema importância que se avaliem, também, as alterações em funções cognitivas. Assim, essa avaliação deve ser feita de forma multidisciplinar”, ressalta Marilene.
Depois de certo tempo, a madrasta do adolescente notava outras alterações no humor e no relacionamento de Lincoln. Antes ele era uma criança calma, mas passou a ser muito mais agitada e não esperava que outras pessoas concluíssem o que estavam dizendo – sempre as interrompia. Observando todas as alterações e acompanhada do pai do adolescente, o levou para uma consulta com um neurologista que, posteriormente, o encaminhou para um psicólogo e, juntos, definiram o tratamento.
Marilene explica, ainda, que estas alterações comportamentais presentes no TDAH não favorecem as relações sociais. “Muitas vezes, o ciclo familiar pode ajudar ou atrapalhar ainda mais os sintomas; é preciso que os pais, quando os filhos ainda são pequenos, criem um ambiente onde possam favorecer a relação e inserção social daquele que tem o transtorno.” Este contexto apresentado pelo paciente é chamado, na psicanálise, de pistas conceituais.
Os testes para identificar a presença do transtorno avaliam principalmente a dificuldade de memória de trabalho. “Podemos exemplificar assim, se uma pessoa passar cinco informações para uma criança com TDAH, ela só guarda duas. É como compararmos um pendrive de 10 gigabytes com um de dois”, comenta a psicóloga.
Tratamento
Para o tratamento integral do TDAH, por ser decorrente de múltiplos fatores, especialistas ressaltam a relevância de outros métodos associados à medicação, e até de outras alternativas, ainda em pesquisa, ao tratamento convencional. O consumo de medicamentos para o tratamento do TDAH deve ser bem acompanhado, para se evitar seu uso indiscriminado.
“A reabilitação cognitiva é um dos principais tratamentos para este transtorno. Sendo importante a associação do tratamento convencional (medicação), com a prática de esportes e realização de atividades artísticas”. Ela explica que a arte e o esporte ajudam principalmente na organização e na aceitação de regras e limites.
Lincoln, desde os 8 anos, joga futebol, e esta atividade contribuiu para deixá-lo mais calmo. Hoje, o adolescente já não faz mais uso de medicação. O esporte, por si só, é necessário para que ele gaste suas energias. No entanto, o adolescente ainda tem dificuldades na comunicação; até hoje, a pressa em terminar as frases é muito frequente.
“É importante garantir o rigor do diagnóstico e acompanhamento por profissionais especializados para o paciente com TDAH. Pois, somente assim, é possível se promover sua qualidade de vida”, finaliza Marilene.