Samonte: empréstimo de R$ 20 milhões gera desacordo entre legislativo e executivo
Foto: Câmara Municipal de Santo Antônio do Monte (Samonte) / Divulgação - Redes Sociais

Lei sancionada após as eleições também fixa 13º salário, mas especialistas apontam possíveis violações constitucionais e riscos de improbidade.

O prefeito de Santo Antônio do Monte, na Região Centro-Oeste de Minas, Leonardo Lacerda Camilo (PSD), sancionou, no final de dezembro, um reajuste salarial para os cargos de prefeito, vice-prefeito e secretários municipais. Além do aumento, a norma também fixou o 13° salário.

A decisão, formalizada pela Lei nº 2750/2024, levantou dúvidas sobre sua legalidade e gerou debate entre especialistas e a população.

Reajuste salarial prefeito, vice e secretários de Santo Antônio do Monte

A nova legislação, sancionada em 20 de dezembro de 2024, define os salários dos gestores municipais para o mandato de 2025 a 2028.

Com o reajuste, o salário do prefeito subiu de R$ 18.529,04 para R$ 20.922,75, representando um aumento de quase 13%.

 O vice-prefeito passou a receber R$ 14.645,93, enquanto os secretários municipais tiveram salários fixados em R$ 10.432,39.

Além disso, a lei regulamenta o pagamento do 13º salário e outros direitos trabalhistas, como 1/3 de férias. No entanto, proíbe gratificações, abonos ou qualquer outra forma de remuneração extra.

Outras medidas incluem:

  • Possibilidade de secretários que ocupem cargos efetivos no município acumularem benefícios apenas sobre o salário efetivo.
  • Ajustes anuais a partir de 2026, baseados em índices como o INPC.
  • Descontos obrigatórios para previdência e Imposto de Renda.
  • Procedimentos específicos para gestores em licença médica ou casos de excesso de despesas com pessoal.

A lei entrou em vigor em 1º de janeiro de 2025, com efeitos retroativos à data de publicação.

Questionamentos sobre legalidade

De acordo com especialista e advogado Jarbas Lacerda, a medida fere o princípio da anterioridade, previsto na Constituição Estadual de Minas Gerais.

“Essa lei editada depois do processo eleitoral fere o princípio da anterioridade, o qual determina que as matérias tratando sobre esse tema precisam ser discutidas, votadas e promulgadas antes de iniciado o processo eleitoral”, afirmou

Ele reforçou que a edição da norma fora desse prazo determina sua ilegalidade. Outro ponto levantado pelos especialistas é que a fixação dos subsídios deve ocorrer em uma legislatura para a seguinte.

“A fixação dos subsídios deve ocorrer antes do processo eleitoral, sob pena de se legislar em causa própria. Ao que consta, o prefeito foi reeleito e, como tal, participando do processo eleitoral e também do processo legislativo, está legislando em causa própria, pois ele é o beneficiário da norma que entraria em vigor em 2025”, destacou o jurista.

Além disso, os entendimentos sobre a violação do princípio da anterioridade têm respaldo em decisões de órgãos competentes.

“Os entendimentos que tratamos aqui são referenciados tanto pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais quanto pelo Tribunal de Contas de Minas Gerais. É provável que o Ministério Público proponha ação civil pública visando decretar a inconstitucionalidade da matéria e a devolução dos recursos que forem percebidos pelos beneficiários da citada lei”, completou Jarbas

Por fim, a devolução dos valores pagos indevidamente também está no radar das autoridades.

“É certo que os destinatários dessa lei vão devolver seu recurso atualizado, seja por ação proposta pelo Ministério Público, por ação popular proposta por qualquer cidadão ou por iniciativa do Tribunal de Contas de Minas Gerais”, concluiu.

Possíveis ilegalidades

O advogado Caio Martins também analisou juridicamente o aumento do subsídio de prefeitos e a instituição de 13º salário para o cargo.

Ele mencionou possíveis ilegalidades, considerando o momento de aprovação das medidas, após as eleições, e se elas respeitaram os limites constitucionais.

“O artigo 29, inciso V, da Constituição Federal determina que o subsídio de agentes políticos, como prefeitos, deve ser fixado por lei específica, de iniciativa da Câmara Municipal. Qualquer alteração ou vantagem deve estar amparada em legislação prévia, aprovada antes do início do mandato”, explicou.

Ele afirmou que o artigo 29, inciso VI, proíbe aumentar o subsídio ou criar novas vantagens durante o exercício do mandato.

 “Isso fere o princípio da impessoalidade e pode caracterizar desvio de finalidade”, completou.

Sobre o 13º salário, o advogado afirmou que o benefício está permitido, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (ADI 2238/SC), mas depende de aprovação de lei específica anterior ao início da legislatura.

“Se o prefeito cria o benefício durante o mandato ou sem previsão legal, há inconstitucionalidade evidente”, ressaltou.

Caio Martins também alertou para violações aos princípios da moralidade e eficiência.

 “Atos administrativos devem respeitar a ética e o interesse público. Criar benefícios financeiros para o próprio mandato é imoral e pode gerar questionamentos sobre a gestão dos recursos públicos”, pontuou.

Além disso, o especialista chamou atenção para a Lei de Responsabilidade Fiscal, que exige estudos de impacto financeiro antes de aprovar despesas.

“Sem planejamento, essas medidas podem infringir os artigos 16 e 17 da LRF”, analisou.

Ele ainda destacou a possibilidade de responsabilização por improbidade administrativa. “A Lei 8.429/1992 prevê que atos que violem os princípios da Administração Pública, como legalidade e moralidade, podem levar à responsabilização civil, administrativa e criminal”, concluiu.

Prefeitura de Santo Antônio do Monte sobre reajuste salarial do prefeito, vice e secretários

Em nota, a Prefeitura de Santo Antônio do Monte informou que o reajuste seguiu todos os trâmites legais e obteve aprovação da Câmara Municipal antes da sanção.

O órgão ressaltou que atualizou os valores para refletir as responsabilidades e demandas dos gestores.