Amanda Quintiliano
Foi aos 38 anos que Fátima Gonçalves venceu a falta de motivação, interesse e até dificuldades financeiras para se animar a aprender muito mais que as primeiras letras. Negra, mulher e pobre. Ela está na parcela da população brasileira que até os 40 anos não era alfabetizada.
Fátima não se contentou apenas com o ensino médio. Dez anos depois, já com 48 anos ela retornou às salas de aula, desta vez para conseguir se graduar em história. Foi em 2013 que, pela primeira vez, ela se sentou em uma carteira da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg).
De lá pra cá foram muitos os desafios vencidos e vitórias. A mais recente conquista é a aprovação para apresentar o pré-projeto de conclusão de curso na cidade de Porto, em Portugal, no final de setembro. O tema é “A Comensalidade no Congado e no Reinado do Centro-Oeste”.
“Nunca pensei que a proposta do projeto ia chamar a atenção dos professores e coordenadores. Eles me disseram que eu tive um olhar sensível dentro do congado e reinado quando eu percebo a sociabilidade, a história, a memória oral”, conta a estudante que chegou a ser aprovada em outra universidade para o curso de arquitetura.
“História sempre foi meu sonho”, enfatiza.
Vaquinha
Para dar mais este passo na trajetória de quem sonha em ser “mestre em história” ela precisa de ajuda. Desde que perdeu a pensão por morte do marido dela no final do ano passado, ela vive com uma bolsa de R$400 por mês por participar de projetos da universidade.
O custo da viagem é de R$10 mil. A Uemg irá custear a passagem área, reduzindo o valor para R$6 mil. Para viabilizar que Fátima voe em busca da concretização do sonho, professores, alunos e amigos fizeram uma “vaquinha on-line”. Até o final da manhã desta quarta-feira (28) ela havia arrecadado R$1.250,00.
O II Encontro Internacional de Reflexão sobre Práticas Artísticas Comunitária (EIRPAC) será entre os dias 19 e 21 de setembro e é promovido por várias instituições de ensino.
“Fui muito além do que pensei em ir e agora quero chegar a Portugal”.
História
Quem escuta a história de Fátima não sabe o quanto foi difícil manter a esperança acesa para alimentar o ideal de ser professora. Aos 10 anos ela perdeu os pais e foi morar com a irmã. Até os 14 anos foi vítima de violência sexual praticada pelo cunhado.
Foi quando, ainda aos 14 anos, surgiu a chance de deixar Teófilo Otoni e vir para Divinópolis. Aqui, foi doméstica por muitos anos. Se casou e teve um filho.
Quase 30 anos despois de ter colocado os pés pela primeira vez na terra do “Divino” ela carrega o orgulho de ter vencido.
“Sou mulher, sou negra, vim parar nessa cidade aos 14 anos para trabalhar e sobreviver como doméstica. Hoje me sinto confortável para deixar de ser um objetivo de pesquisa dentro da universidade para me tornar uma pesquisadora”, finaliza.
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