Diego Henrique
A doméstica Mailza Antonia de Souza se preparava para a chegada da sua segunda filha. O enxoval já estava pronto, o coração acelerado na expectativa de conhecer o rostinho da pequena Helena que passaria então, a fazer parte da família Souza. A data para o parto já estava marcada e foi aí que Mailza viu o seu sonho ser interrompido.
A gravidez foi de risco. A mãe sofria com pressão alta e adquiriu diabetes durante a gestação. O controle era feito por um enfermeiro e uma ginecologista que atendiam em uma unidade de saúde próximo da casa dela, em Itapecerica.
Mailza se preparava para o parto que estava agendado para o dia 21 de junho, porém como a doméstica não sentiu contrações, ela procurou a Santa Casa de Misericórdia e Maternidade Santana dois dias depois.
“O médico me olhou e disse que eu precisava ser transferida para uma avaliação com obstetra, porém eles não cumpriram o encaminhamento e eu precisei voltar para a casa”, disse Mailza Antonia.
No dia 25 ela foi até a unidade de saúde onde fazia o pré-natal e o enfermeiro já não conseguia ouvir os batimentos do coração da criança. A mulher foi encaminhada novamente a Santa Casa e após esperar 40 minutos para ser atendida ela foi liberada. O médico alegou que ainda faltavam nove dias para a criança nascer.
“Eles me colocaram em uma sala com duas enfermeiras. Uma delas ouviu as batidas do coração, mas entraram em dúvida. O médico atendeu todos os pacientes primeiro e depois veio me atender e fez o exame de toque. Eu já estava de 40 semanas e seis dias. Ele disse que não tinha dilatação e poderia esperar mais nove dias para ela nascer. A minha irmã queria que ele assinasse um termo de responsabilidade por me liberar, mas ele não assinou”, contou Mailza.
Preocupada com a demora, a mulher voltou à unidade de saúde onde fez o pré-natal e um enfermeiro pediu um ultrassom. Ela foi até a cidade de Cláudio para fazer o exame e foi constatado que o ritmo cardíaco da criança estava desacelerado.
“Chegamos à Santa Casa de Cláudio e fui atendida de forma rápida. A médica abriu ultrassom e já foi me preparando para a cirurgia. Quando retiraram a criança, ela já estava sem vida. Ela seria uma criança saudável, já pesava 3,5kg e media 50cm”, afirmou e completou: “Passou da hora de nascer porque a Santa Casa de Itapecerica não soube atender”, relatou.
De acordo com a mãe da criança, o atestado de óbito apontou “sofrimento fetal” como causa da morte. Sofrimento fetal consiste na diminuição ou ausência da assimilação de oxigênio recebida pelo feto através da placenta.
Para Mailza, houve negligência médica por parte da Santa Casa de Itapecerica. Ela disse que irá processar a unidade e destacou o fato de não haver nenhum obstetra na cidade para atender as gestantes e fazer os partos. Ela já solicitou o histórico de atendimento dos últimos três meses, porém o documento não foi liberado.
Santa Casa
O administrador da Santa Casa, Gabriel Dias disse que a unidade realizava cerca de sete partos por mês e desde março deste ano os atendimentos de obstetrícia foram suspensos, após o profissional que atendia no local pedir o desligamento devido a uma orientação médica. Outro médico não foi contrato devido a falta de recursos. Segundo ele, o valor repassado pela prefeitura da cidade é insuficiente.
“Hoje o SUS oferece na Santa Casa, clínico geral, anestesista e cirurgião geral. Quando o profissional foi desligado nós comunicamos a prefeitura para que as providências pudessem ser tomadas, até porque o valor repassado atualmente pelo município não consegue cobrir a despesa com a contratação de um novo obstetra” afirmou o administrador.
Investigação
Segundo a Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Itapecerica, o município repassa mensalmente para a Santa Casa R$ 170 mil para o pagamento de médicos, enfermeiros e compra de material para atendimento ao Sistema Único de Saúde (SUS). O contrato exige que a unidade ofereça um médico, um enfermeiro, um técnico em enfermagem e um recepcionista.
Além do repasse mensal, o município ainda disponibiliza ambulâncias para transferência de pacientes da rede pública de saúde.
Investigação
Em entrevista ao PORTAL, a secretária municipal de Saúde, Sarah Rocha afirmou que um comitê está investigando o caso. Quando questionada sobre a falta de obstetras na Santa Casa, a secretária disse que o município está à procura de um novo profissional.
“O município tem referência em Divinópolis, Oliveira e Belo Horizonte. Casos que não podem ser atendidos aqui são transferidos para essas cidades. A nossa dificuldade não é em relação a recurso, mas sim em relação a profissionais qualificados que queiram atuar na Santa Casa,” explicou a secretária.
Dor
Agora, a jovem mãe vive dias de dores e clama por justiça.
“Não me conformo e acho que precisa ser feito justiça. Quantas Helenas precisam morrer para resolver o problema da saúde no município?” finalizou.