Rodrigo Dias
Fui criado em Carmo do Cajuru, uma cidade pequena do interior de Minas Gerais. Dessas em que é permitido conhecer quase todos pelo nome. Na minha infância e adolescência, do padre ao prefeito, todo mundo, de alguma forma, era próximo um do outro.
Esta afinidade era boa. Sabíamos um pouco da vida um dos outros: em que fulano trabalhava, com quem cicrano era casado, se beltrano era gente do bem ou se era uma pessoa de quem deveríamos desviar do caminho.
Essa proximidade permitiu conhecer algumas das figuras marcantes da cidade. Além de ouvir falar a respeito, tínhamos a oportunidade de conviver com quem era protagonista da história.
Essa possibilidade é enriquecedora. Às vezes, por ser algo tão simples, muitos se furtam do prazer deste contato mais íntimo. A conversa ao pé do ouvido é reveladora e cheia de detalhes.
Mas o progresso está aí. Com ele a cidade cresce, os muros ficam mais altos e os portões das casas fechados; mais pessoas preenchem a vida da cidadezinha. Para piorar, as pessoas de antigamente vão, uma a uma, nos deixando e levam consigo o hábito da oralidade.
Aquela troca que era feita por meio de longas conversas na quermesse da igreja, durante um desfile de carnaval ou num botequim em que a conversa fervia; principalmente em época de eleição para prefeito e vereador.
É bem verdade que os mais diversos legados estão devidamente registrados. Contidos em fotos, textos de jornal, cartas e em outros meios. Mas a oralidade, que é o meio mais rudimentar de repasse do conhecimento, vai se perdendo com o tempo.
Agora tudo é digital. Um curti superficial. Um compartilhar protocolar; sem vontade quase.
Ao voltar à cidade há pouco tempo encontrei um paradoxo na perda. Ao participar do velório de uma pessoa querida, encontrei outras tantas pessoas queridas que também fizeram parte da minha infância e adolescência. Momento para contar e recontar histórias. A oralidade se fez presente.
A oralidade é mais que meio. Ela é comunhão, troca e compartilhamento de fato. Tudo num tempo presente. Ela é pertencimento, senso comunitário. A oralidade está em nós, esperando para ser vivida.
Para suscitar não depende de dimensão demográfica. Vai além. Oralidade é conexão de laços. Muito maior que agente. Está ligada à afetividade. Vida em sociedade no sentido mais pleno desta palavra.
artigorodrigodias@gamil.com